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A Kings League não nasceu para substituir o futebol. Mas nos prova como o futebol precisa olhar para sua audiência para continuar relevante e com potencial de engajamento que sempre teve.

Criada por Gerard Piqué, ex-zagueiro do Barcelona e da Seleção espanhola, é transmitida por plataformas como Twitch, TikTok e YouTube e propõe uma nova relação com o jogo: mais ágil, mais caótica, mais transparente e, principalmente, mais interativa. Seu impacto não está apenas nas regras alternativas ou nos nomes midiáticos que ela atrai, mas na forma como transforma espectadores em participantes ativos de um espetáculo pensado para a lógica da atenção e do entretenimento.

Em um cenário onde o tempo do público é disputado por plataformas e algoritmos, não basta entregar paixão ou tradição. É preciso entregar formato, conexão e experiência. É nesse vácuo de engajamento que a Kings League se posiciona. Seu conteúdo não se limita aos 90 minutos tradicionais do futebol de campo. Na verdade, ele nasce antes, e se distribui durante e para continuar vivo depois. Por isso, a liga não é apenas consumida: ela é acompanhada, comentada e, consequentemente, compartilhada.

Esse modelo, construído com influenciadores, decisões por enquete e dinâmicas gamificadas, pode parecer distante da realidade dos clubes tradicionais. Mas aponta para um princípio fundamental: o engajamento de verdade acontece quando o público se sente parte da história. E isso vale para qualquer modalidade, qualquer nível de investimento, qualquer mercado. O que está em jogo é a capacidade de traduzir a emoção esportiva em relacionamento recorrente para, a partir disso, gerar valor.

Fenômenos como a Kings League não surgem do nada — eles ocupam espaços deixados por formatos tradicionais que não conseguiram evoluir na mesma velocidade da audiência. E essa tensão entre inovação e herança esportiva não é nova. Em 2021, a proposta da Superliga Europeia, que seria uma liga fechada com os principais clubes do continente, foi um exemplo claro disso. Apresentada como solução para a “insustentabilidade financeira” dos grandes clubes, a ideia foi rapidamente rechaçada por torcedores, federações e governos. Mas seu recado ficou: há espaço para o modelo atual se reinventar para se conectar com seus respectivos públicos e gerar ainda mais audiência. A Superliga não falhou por ser disruptiva demais, mas por ignorar o engajamento como pilar essencial do futebol. Tentou impor um modelo de cima para baixo, sem escuta. E num mundo em que o torcedor tem voz, isso se paga caro. 

Outro exemplo relevante vem do mundo do basquete. Em 2017, o BIG3, uma liga de basquete 3×3 criada pelo rapper Ice Cube, estreou com ex-jogadores da NBA, regras inovadoras e uma proposta mais dinâmica para o público televisivo e digital. Mesmo sem ameaçar diretamente a NBA, o BIG3 mostrou que há espaço para novos formatos quando a proposta é clara, bem executada e construída com base em entretenimento e conexão. O sucesso da liga com audiências mais jovens e sua parceria com canais como CBS evidenciam que o esporte pode ser reimaginado sem perder legitimidade, desde que respeite a experiência do fã. 

A discussão, portanto, não é sobre copiar formatos, mas sobre entender como potencializar o que já existe a partir da análise de comportamentos dos fãs. A Kings League, por exemplo, é uma espécie de laboratório que está promovendo vários experimentos. E nessa conta, o futebol, assim como os esportes em geral, precisam observar o que esses novos produtos revelam, e assimilar as novas regras do jogo, que estão mudando.

Na OutField, enxergamos inovação não como ruptura, mas como uma possibilidade de atualização de contexto. Acreditamos que é possível transformar a relação entre esporte e audiência com estratégia, criatividade e inteligência de dados. Seja no desenho de novas plataformas de engajamento, na estruturação de ativos esportivos como negócios sustentáveis ou na criação de produtos que conectem marcas e comunidades, nosso trabalho é transformar tendências em soluções.

Ao lado de clubes, ligas, atletas e investidores, temos atuado em projetos que reconfiguram o papel do esporte na economia da atenção. Desde o desenvolvimento de modelos de monetização baseados em comunidade até fundos estruturados para viabilizar iniciativas de impacto. O que a Kings League provoca, nós ajudamos a construir: novas formas de ativar o torcedor, gerar valor a partir da influência e pensar o esporte como plataforma de relacionamento.

Se o jogo está mudando, é porque o público já mudou. E quem quiser seguir relevante como negócio, marca e produto vai precisar entender que engajar não é só entreter. É convidar para jogar junto. Com estratégia, com propósito e com coragem de explorar o que ainda está por vir.